quarta-feira, 4 de junho de 2014

Droga

Percebi que vivo de sonhos. Sem eles não tenho fome, fé ou boa vontade. Minhas bochechas perdem o tom rosado e meus olhos se enchem de neblina.

Parece que falta alguma coisa. Acho que não sou do tipo que sabe ficar à deriva no mundo e no tempo. Preciso de rumo. E preciso de um rumo que possa mastigar e saborear previamente.

Planejo minhas conquistas. Meu ceticismo não me deixa acreditar que a sorte e o acaso se esforçarão por mim. Por isso, corro incessantemente atrás de cada ambição.

E como cansa! Às vezes, tenho a impressão de que trituraram minhas aspirações e salpicaram o mundo com seus pedacinhos.

Minha vida funciona como aquelas promoções de jornais e revistas, que todo domingo publicam um selo para juntar e trocar por algo grande no final. Para mim, porém, todo dia é domingo. E o final é sempre o começo de outra coisa.

Existo para viver momentos felizes, mesmo que para isso gaste dias apenas sobrevivendo. Minha ansiedade é anestesia para a alma. Quando posso sonhar, nem sinto que o tempo passa esfolando minha pele.

Que passe esse tal de tempo! Se for para viver alegrias, quem se importa? No final, somos todos colecionadores dessas cicatrizes de guerra que chamamos ingenuamente de rugas, provas de que já vivemos e ganhamos muitas batalhas.

Demorei para entender o que as pessoas queriam dizer quando me aconselhavam a não ter medo do futuro. Quando percebi, já era passado.

Sonhar não é cura, mas é terapia. É substância que alivia os sintomas de uma cronofobia que me assombra desde que comecei a entender o mundo.

Sem sonhos, entro em abstinência.

(Amy Sol)

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